terça-feira, 27 de janeiro de 2015

TJ-RS dá provimento a recurso e chancela direito de crítica e fiscalização contra ato de servidor público juiz de direito

Trechos da decisão (grifei):

"...Da imputação oficial
A inicial imputa ao recorrente a prática do delito previsto no art. 140, caput, cumulado com o art. 141, II e III, ambos do Código Penal, porque, no dia 04 de julho de 2011, em horário e local incertos, teria injuriado a vítima Luis Filipe Lemos Almeida, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, ao postar comentário na rede mundial de computadores, qualificando de forma negativa atitude tomada pela vítima no cumprimento de seu dever legal. Na oportunidade, o denunciado postou em seu twitter, na internet, que “Ato do Magistrado de São Chico em apreender menores por perturbação em palestra sua, se for realmente isso, é tremendo abuso de autoridade”. O comentando seria relativo a atitude da vítima, Juiz de Direito, que proferira palestra a estudantes de ensino fundamental no CTG Negrinho do Pastoreio, em São Francisco de Assis, tendo determinado a policiais que identificassem e adotassem procedimentos legais quanto a duas crianças que estariam perturbando o evento.

Da Injúria
De acordo com os ensinamentos de Rogério Greco, “ao contrário da calúnia e da difamação, com a tipificação do delito de injúria busca-se proteger a chamada honra subjetiva, ou seja, o conceito, em sentido amplo, que o agente tem de si mesmo”. [1]
Ainda, referido doutrinador cita em sua obra a definição trazida por Aníbal Bruno, nas seguintes expressões:

“Injúria é a palavra ou gesto ultrajante com que o agente ofende o sentimento de dignidade da vítima. O Código distingue, um pouco ociosamente, dignidade e decoro (...). Costuma-se definir a dignidade como o sentimento que tem o indivíduo do seu próprio valor social e moral; o decoro como a sua respeitabilidade. Naquela estariam contidos os valores morais que integram a personalidade do indivíduo; neste as qualidades de ordem física e social que conduzem o indivíduo à estima de si mesmo e o impõem ao respeito dos que com ele convivem. Dizer de um sujeito que ele é trapaceiro seria ofender sua dignidade. Chamá-lo de burro, ou de coxo seria atingir seu decoro”. (ênfase acrescentada)[2]


Complementa Greco dizendo que, na injúria, não existe imputação de fatos, mas, sim, de atributos pejorativos à pessoa do agente. Exemplifica dizendo que chamar alguém de “bicheiro” configura injúria, mas dizer a terceira pessoa que a vítima está “bancando o jogo do bicho”, caracteriza difamação. Por fim, acrescenta que “na injúria não se imputa fato determinado, mas se formula juízos de valor, exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos que importem menoscabo, ultraje ou vilipêndio de alguém” (STJ, Apn 390/DF, Rel. Min, Felix Fischer/CE, RSTJ 194, p. 21).[3] (ênfase acrescentada)

Da análise dos autos, verifica-se que a conduta do acusado em postar em seu twitter pessoal a frase “Ato do Magistrado de São Chico em apreender menores por perturbação em palestra sua, se for realmente isso, é tremendo abuso de autoridade”, é atípica, pois quando assim agiu não atribuiu ao Magistrado nenhuma qualidade pejorativa, capaz de ofender sua dignidade e decoro. Ao contrário, sua conduta resumiu-se a noticiar fato que entendia injusto. Ao ser interrogado, mencionou que estava em seu escritório e, durante o intervalo, recebeu, pelo próprio twitter, a informação de que o ofendido teria apreendido menores durante palestra por ele ministrada. Disse que não concordou com a ocorrência e apenas emitiu sua opinião pela rede social, esperando que pessoas comentassem a publicação. Referiu não imaginar que a postagem fosse tomar tamanha proporção e ressaltou que jamais teve a intenção de ofender o Magistrado (CD, fl. 112).

Certo é que o acusado poderia, ou, quiçá, deveria abster-se de emitir sua opinião, pois, segundo ele próprio, não possuía conhecimento real do fato e pronunciou-se com base em informações de terceiros. Deveria, antes, investigar a veracidade do acontecimento. Inquestionavelmente, o acusado tem formação que determina esse resguardo.

Entretanto, sua conduta não se subsume ao tipo penal da injúria, de modo que a absolvição se impõe. O caso dispensa maiores considerações, não se fazendo necessário, também, tecer comentários acerca do elemento subjetivo desse crime, amplamente enfrentado na sentença, diante da decisão que ora se produz.

Voto, portanto, por dar provimento ao apelo, para o fim de absolver (omissis), por atipicidade da conduta, com base no art. 386, III, do Código de Processo Penal. Em razão disso, fica prejudicada a análise da preliminar de incompetência de foro arguida nas razões de apelação.


Dr.ª Ivortiz Tomazia M Fernandes (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).

Dr. Volcir Antonio Casal

De acordo com o relator.

O acusado deveria ter cautela antes de divulgar sua manifestação sobre um fato que não tinha presenciado, na própria mensagem constou a expressão ’se for realmente isso’.

Apesar disso, ficou evidenciado que não havia qualquer intenção de ofender ou denegrir a imagem da vítima, apenas opinou sobre um fato que considerou errado.
Não houve crime.


DR. EDSON JORGE CECHET - Presidente - ... Comarca de Santiago: "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO."


Juízo de Origem: VARA CRIMINAL SANTIAGO - Comarca de Santiago



[1] GRECO. Ibidem. p. 348.
[2] Idem. p. 348.
[3] GRECO. Ibidem. p. 348.