segunda-feira, 14 de julho de 2014

O mandado de segurança e a substituição recursal

O mandado de segurança é uma ação impugnativa, normatizada na Constituição Federal e na Lei 12.016/2009, que no art. 1º contempla a seguinte premissa:

Art. 1o  Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

Não obstante, há inúmeras decisões de várias instâncias judiciais que denegam a segurança em virtude de o uso ser alegadamente manejado como substituto recursal. Cito, por exemplo, a irrecorribilidade de decisões interlocutórias em sede de Juizado Especial Cível, ante a Lei 9.099/90, ou seja, não se permite o recurso de agravo de instrumento ou retido, e muitos operadores do Direito impetram o mandado para impugnar decisões interlocutórias.

No julgamento do Mandado de Segurança Nº 71004954632, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais do TJ-RS, relatora Marta Borges Ortiz, julgado em 10/06/2014, oriundo de Passo Fundo-RS, ficou consignado: "O mandado de segurança não pode ser admitido como substitutivo do agravo de instrumento, inexistente no juizado especial cível. Ressentindo-se a decisão combatida de ilegalidade ou mesmo abuso de poder e não sendo o mandado de segurança o substituto do recurso de agravo de instrumento, este incabível no âmbito dos juizados especiais, a denegação da segurança é medida que se impõe".

No entanto, não tenho como acertado o entendimento de decisões como a citada acima. A Carta Maior garante o amplo e irrestrito acesso do cidadão ao Judiciário através da postulação de advogado. Assegura que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça a direito. O Código de Processo Civil ordena o duplo grau de jurisdição e organiza um rol de recursos cíveis. Portanto, não é crível que direito líquido e certo do cidadão não seja protegido pelo Judiciário sob o argumento de que o mandado foi manejado como sucedâneo de recurso incabível em determinado rito. É medida inconstitucional, inclusive, e ensejo para ações reparatórias e representações nas corregedorias dos TJ's e no CNJ.

Pois como ficaria a situação de um cidadão que está ilegalmente sofrendo constrição no seu patrimônio em virtude de decisão judicial ilegal de um magistrado (a), e não poder recorrer da decisão em sede de Juizado Especial pois a respectiva lei não contempla o recurso contra decisão interlocutória? É absolutamente patente que o mandado de segurança é o meio eficaz e legal para isso. Não obstante, infelizmente a prevaricação judicial igualmente tem sido um empecilho para que o direito do cidadão seja analisado, sob os mais diversos - e temidos - argumentos.

Vejo a questão da utilização do mandado de segurança como sucedâneo recursal muito delicada, na medida em que muitos casos denotam perfeitamente a lesão a direito líquido e certo mas que não são protegidos em virtude desse entendimento que veda a substituição da medida por recurso. Afirmo mais: o direito positivo brasileiro autoriza a proteção mesmo se indiretamente é usado como sucedâneo recursal (desde que não haja outra medida cabível), em havendo lesão a direito líquido e certo. Não contempla a necessidade da concessão da ordem em caso de não haver lesão ou, mesmo havendo, existir outra medida judicial oponível, como embargos de terceiro, por exemplo.

Aliás, a Súmula 267 do STF determina que “não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição”.

Portanto o mandado de segurança é a única saída para resguardar direito lastimado por ordem de autoridade, não existindo qualquer norma que vede o seu uso em qualquer rito.