quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Lei Maria da Penha: isonomia legal?

Coisas absurdas ocorrem no Brasil em virtude das leis e de suas interpretações. Cito um exemplo em duas cenas relacionadas com a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06):

Cena 1: Um homem é perseguido pela ex-companheira com ligações ameaçadoras e via mensagem sms, xingamentos na rua e importunado no seu local de trabalho. Aguenta calado. Registra B.O., representa contra a mulher e aguarda o procedimento. O seu Advogado ajuiza medida cível de medida protetiva no Judiciário para evitar os constrangimentos e abalos morais ao homem com base na mesma Lei citada. O pedido é negado sob a alegação de que a referida Lei, na interpretação do juiz, abarca apenas as mulheres. Enquanto isso aguarda-se a conclusão do inquérito policial por meses sem qualquer resultado prático e na sequência dos mesmos atos injuriantes.

Cena 2: A mesma ex-companheira que persegue, ameaça, xinga e debocha do ex-companheiro se dirige até a delegacia de polícia e registra uma ocorrência por ameaça do ex-companheiro sem que jamais isso tivesse ocorrido, apenas para que ele tenha de prestar depoimento (querendo) e após ser encaminhado ao Judiciário. Não existem provas mínimas do ocorrido no momento da elaboração do B.O., como nome de testemunhas ou provas materiais. Nada. A ocorrência é lavrada e o pseudo-acusado é imediatamene contatado para se dirigir até a delegacia para, querendo, prestar depoimento. Contrata Advogado (e para isso arca com honorários) e tem de suportar a chateação do relato da ocorrência de um suposto crime praticado por si apenas como vingança da ex, o que tipifica a denunciação caluniosa (crime pelo art. 339, do Código Penal) cometido por ela mas que apenas daqui há alguns meses ou anos poderá ela ter de responder caso não comprovado o que registrou.

Este caso demonstra perfeitamente a ausência de isonomia legal e procedimental, tanto na via administrativa (inquérito policial) como na judicial.

Em tempo: a Lei Maria da Penha é salutar e muito contribui para diminuir a violência contra a mulher. Eu mesmo ajuízo ações e acompanho vários casos de violência contra mulheres, representando e defendendo as mesmas. No entanto, relato aqui o outro lado, o lado do homem também como vítima, geralmente na forma da violência psíquica e moral (art. 7º, II e IV da referida lei), que também ocorre e não detém o mesmo respaldo na maioria das comarcas brasileiras.

Além desse, outros exemplos são vivenciados diariamente na labuta advocatícia.

Todos são iguais perante a lei? Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações? No Brasil não. Homens se beneficiam mais em algumas situações e mulheres igualmente em outras.

Poderia igualmente adentrar na esfera do Direito Eleitoral, área em que proficuamente também atuo e sou um estudioso da matéria: as legislações para as eleições municipais são sobremaneira cogentes em relação as mesmas nas eleições federais e estaduais. Candidatos ao cargo de Prefeito e Vereador são punidos com multas bem maiores em caso de propagandas antecipadas, por exemplo, mesmo na  maioria das campanhas municipais o valor arrecadado, declarado e gasto ser abismalmente menor do que uma campanha para Deputado ou Presidente da República.

Para encerrar, me ocorreu uma lembrança acerca do exercício da Advocacia e da indispensabilidade constitucional à administração da Justiça, eis que qualquer cidadão somente poderá participar passiva ou ativamente de ação judicial por intermédio de um Advogado (art. 36 do Código de Processo Civil): se o Advogado ingressa com uma ação judicial, ou uma defesa, deverá valer-se da procuração lhe outorgada, ainda com o prazo de até 30 dias (15+15) para apresentação em caso de ingresso de urgência. Passado este prazo e não apresentada a procuração, todos os atos são tidos como nulos, ou seja, há nulidade absoluta. De outra banda, vários cidadãos comparecem em audiência sem Advogado público ou privado e mesmo assim a audiência ocorre na tentativa de acordo de pensão alimentícia, por exemplo, sem que tivessem sido procurados Advogados dativos no átrio do Fórum. Como isso? E a obrigatoriedade de contar com o Advogado em juízo não gera a mesma nulidade dos atos ante a ausência do profissional?

Não sou como o Lasier Martins que critica e não aponta a solução. A minha opinião para solucionar tais casos é simples mas não menos polêmica: menos quantidade de leis e mais objetividade técnica das mesmas. A Constituição Federal é o maior exemplo de Lei robusta e retórica, o que dá ensejo a diversas interpretações que acabam por fomentar injustiças e postergação de decisão sobre o pedido. Alia-se isso aos vários Princípios que aparelham o Direito.

Discutir o caso tecnicamente dentro de um processo judicial, com teses dos Advogados de ambas as partes, não tem nada a ver com rasgar a Constituição. Ora, se a Lei Maior esculpe a igualdade de situações perante a lei, qual é a dificuldade de se usar o mesmo dispositivo legal infraconstitucional sobre homens, mulheres, pretos, brancos, ricos, ou pobres?

Atitudes pragmáticas são necessárias para que o cidadão brasileiro e os operadores do Direito encontrem medidas salutares na busca de um direito.