terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Erro ao assinar alvará de soltura em Pelotas-RS define a libertação de traficante condenado

Condenado a 32 anos de prisão - oito dos quais se safara - o traficante Valdomiro Soares de Oliveira, o Índio - um dos líderes da quadrilha que movimentava 80% da droga da Região Sul, desmantelada pela Polícia Federal em 2009 - saiu tranquilo do Presídio Regional de Pelotas (RS), sem subornar ninguém, nem sujeitar-se aos riscos de uma fuga. Despediu-se acenando aos carcereiros.

Índio foi libertado indevidamente por meio de um alvará de soltura que se referia a um único processo, mas que conteve os números de duas outras ações penais. Agora, é considerado foragido da Justiça.

O traficante foi solto em 14 de novembro, uma segunda-feira, em meio ao feriadão. O erro judicial foi descoberto três dias depois. Mas só ontem (5) o caso veio a público. Índio deve ter aproveitado esses 22 dias que se passaram para se colocar em local bem distante do Rio Grande do Sul.

Valdomiro tinha sido condenado, em 15 de setembro de 2010, na 1ª Vara Criminal de Pelotas pelo juiz André Luis de Oliveira Acunha, que aplicou pena de oito anos e oito meses de prisão, em regime fechado, por assalto cometido em 24 de abril de 2009, contra a agência do então Banco Real, em Pelotas.

A 5ª Câmara Criminal do TJRS proveu o recurso de Valdomiro, acolhendo as razões de apelação sustentadas pelo advogado de defesa Santo Viríssimo Camacho Rodrigues.

O Ministério Público Estadual - em manifestação do procurador Lênio Luiz Streck - manifestou-se pela confirmação da pena.

Cumprindo o julgado da 5ª Câmara Criminal, o juiz substituto José Antonio Dias da Costa Moraes assinou o alvará de soltura. No documento que concedeu a liberdade constaram também, indevidamente, os números de outras duas ações referentes a prisões por tráfico de drogas, determinadas pela Justiça Federal.

O caso da soltura indevida chegou ao conhecimento do Ministério Público Federal e foi encaminhado para as direções das Justiças estadual e federal - resultando na abertura de um inquérito que contará com a participação da Polícia Federal.

Erro “absurdo e chocante”

O procurador federal Max Palombo avalia a extensão do erro: "É absurdo, chocante e inadmissível. No mínimo, foi um alvará mal redigido, no qual constam de maneira irregular os números de todos os processos a que o réu respondia, e que chegou ao presídio em dia de plantão".

O delegado da PF Cássio Berg preside o inquérito em que serão apurados quem cometeu a falha, de que maneira ela ocorreu e se houve a intenção de libertar Índio antes do cumprimento da pena.

A Corregedoria-Geral da Justiça abriu processo administrativo interno. Até ontem, havia sete processos administrativos abertos contra magistrados estaduais do RS.

A ficha do traficante e outros detalhes

* Valdomiro Soares de Oliveira, 41 de idade, foi preso após seis meses de investigação, como um dos líderes da associação de dez quadrilhas que atuavam no tráfico internacional. Com a conclusão da investigação da Operação Castelo, foram presas 51 pessoas, em 2009.

* Índio respondia a três processos: um na Justiça Estadual e dois na Justiça Federal. Na estadual foi condenado, em primeira instância, a oito anos e três meses por roubo a banco, em 2009. Mas, por decisão do TJRS, foi absolvido pelo crime de roubo, por insuficiência de provas.

* Na Justiça Federal, Valdomiro foi condenado a 24 anos de prisão por tráfico de drogas.

* O juiz estadual José Antônio Dias da Costa Moraes ordenou - em despacho mandando cumprir a decisão do TJRS - a liberação de Índio apenas no processo julgado pelo TJ gaúcho. Das mãos do magistrado, o documento foi anexado ao processo e encaminhado para o cartório da 1ª Vara Criminal de Pelotas, para que o alvará de soltura fosse redigido.

* Quando o alvará de soltura retornou para a assinatura do juiz Moraes, constavam os números dos outros dois processos da Justiça Federal, em que o acusado havia sido condenado e, pelos quais, deveria ser mantido preso.

* O alvará de soltura foi assinado pelo juiz e encaminhado ao Presídio Regional de Pelotas no dia 14 de novembro.

* Moraes - magistrado titular do Juizado Especial Criminal de Pelotas e também atual diretor do Foro da comarca - assinou o documento de soltura na condição de substituto da 1ª Vara Criminal de Pelotas. Esta é dirigida pelo juiz Alan Tadeu Soares Delabary Junior que, no dia dos fatos (14 de novembro, segunda-feira) estava ausente.

* No presídio, teria sido feita uma conferência de dados, na qual foram cruzados os números dos processos que constavam no alvará com os existentes no sistema da Susepe. Conforme o diretor do Presídio Regional de Pelotas, Ângelo Carneiro, "como não existiam outros processos além dos três mencionados no alvará de soltura, Índio foi liberado".

Contraponto

O que diz José Antônio Moraes, juiz substituto da 1ª Vara Criminal de Pelotas

Ouvido pela jornalista Joice Bacelo, da equipe do jornal Zero Hora, o magistrado José Antônio Dias da Costa Moraes declarou que "pode até ter havido uma falha cartorária, mas o presídio tem a obrigação de fazer a checagem dos dados e quando há irregularidades deve entrar em contato com o juiz".

Ainda segundo o magistrado Moraes, "temos relação direta com os agentes penitenciários, é comum que nos informem quando há casos desse tipo".

O juiz acrescentou que "a escrivã que elaborou o documento disse que o fez de maneira correta e que os números dos processos da Justiça Federal constavam no documento apenas para auxiliar na pesquisa, já que logo em seguida consta a informação sobre a pena que Valdomiro estava sendo liberado".

(Síntese de Espaço Vital)