quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Médico e município devem indenizar primeira cidadã de Xangri-Lá

Obstetra, Secretário da Saúde do município à época, e cidade de Xangri-lá devem indenizar criança que teve sequelas neurológicas graves devido à longa espera para realização de cesárea e falta de estrutura do hospital, que havia sido inaugurado quatro dias antes do parto.

A 10ª Câmara Cível do TJRS determinou aos réus o pagamento de R$ 93 mil por danos morais, pensionamento alimentar fixado em três salários mínimos, além de R$ 2.656,15 por danos materiais relativos às despesas com alimentos, exames, sondas e aparelhos.

A menor tem sequelas neurológicas graves, caracterizadas por paralisia cerebral espástica, crises convulsivas e severo retardo no desenvolvimento neuropsicomotor, conseqüentes à encefalopatia hipóxico-isquêmica por déficit de oxigenação cerebral no período neonatal.

O fato

A mãe entrou em trabalho de parto no início da tarde de 20/01/1998, porém, a autora nasceu apenas às 22h30min, com sofrimento fetal, no Hospital do Município de Xangri-lá. Como a instituição não tinha aparelhagem para promover a oxigenação, a criança foi transferida para o Hospital da Ulbra, em Tramandaí. A ambulância que conduziu a autora levou 50 minutos para chegar ao hospital de Xangri-lá, além do tempo gasto nos 25 km de distância entre as duas cidades. A paciente foi anestesiada pelo próprio obstetra, uma vez que o hospital não contratara este profissional.

Na época, o hospital só tinha alvará para funcionamento como unidade 24h. Após o fato, o CREMERS interditou a instituição e condenou o médico em processo ético-profissional.

De acordo com a perícia, os réus não possuíam os meios adequados e necessários tanto para preservar a integridade da saúde materna, quanto para proporcionar condições que poderiam permitir o desenvolvimento pleno somático, neurológico e psíquico da autora.

Apelação Cível

O relator, desembargador Paulo Roberto Lessa Franz, votou pela condenação do obstetra e do município embasando-se na decisão da desembargadora Rejane Dias Castro Bins sobre o caso.

Na oportunidade, a magistrada destacou que o obstetra fez com que a gestante aguardasse por longo período, mesmo sabendo que o hospital não tinha condições de enfrentar complicações no parto. É incontroverso de que o Hospital do Município demandado não estava em devidas condições para efetuar partos, ainda mais em caráter de emergência, porquanto este sequer contava com anestesista e aparelhagem indispensável a garantir a sobrevivência sem risco de morte da autora. Em que pese o médico ter utilizado técnicas necessárias e aplicáveis ao caso, este agiu com culpa e assumiu o risco quando decidiu manter parturiente em nosocômio sem infraestrutura necessária para a realização de parto cesariano, caracterizando a sua responsabilidade solidária com a do município réu, asseverou a Desembargadora Rejane Bins.
Da mesma forma, a magistrada entendeu ser evidente a angústia e o sofrimento da autora, pois as sequelas a impossibilitam permanentemente de realizar qualquer ato da vida civil e, inclusive, de promover a sua própria subsistência. Nesse sentido, o relator, Desembargador Paulo Roberto Lessa Franz, completou que a autora fora privada do gozo pleno de sua existência, necessitando de cuidados médicos especiais para a vida toda. A suplicante necessita de cuidados médicos diários, bem como despender com medicamentos necessários a manutenção de seu quadro clínico, afirmou.

Os desembargadores Túlio Martins e Jorge Alberto Schreiner Pestana acompanharam o voto do relator.

(Processo nº 70033015785)